
Leituras:
At 2,1-11
Sl 103, 1ab.24ac.29bc-30 31.34 (R.30)
1Cor 12,3b-7.12-13
Jo 20,19-23
50 dias após a Páscoa, os judeus comemoravam a Aliança que
Deus fizera com Israel no Monte Sinai. Nesta aliança Deus entrega a Lei com os
mandamentos e constitui Israel como povo de Deus. Ao celebrar este
acontecimento Israel reafirma a fidelidade de Deus para com seu povo e renova
seu compromisso com seu Senhor. Lucas, então, coloca a descida do Espírito
Santo sobre os apóstolos nesta mesma data para indicar que a lei dada ao povo
agora é internalizada pelos discípulos de Jesus através do Espírito Santo. Assim se constitui a última etapa da comunidade do
Povo de Deus – a comunidade messiânica, que viverá da lei inscrita, pelo Espírito,
no coração de cada discípulo de Jesus (cf. Ez 36,26-28).
Na ocasião dessa festa judeus de todo o mundo se reuniam em
Jerusalém, levando amigos pagãos, simpatizantes da religião judaica. E cada um
falava a língua do país onde morava. Depois de sua Ascensão, Jesus mandara que
os discípulos ficassem em Jerusalém (Lc 24,49) para receberem aquele que Seu
Pai prometeu. E assim, 50 dias depois da sua Páscoa a Promessa de Jesus se
cumpre: o Espírito Santo se manifestou aos apóstolos reunidos no Cenáculo em forma
de línguas de fogo. Os elementos do vento impetuoso e do fogo também são
indicativos da manifestação de Deus, como acontecera no Sinai na ocasião do
estabelecimento da aliança. Na leitura vê-se que todos começaram a falar
línguas diferentes conforme o Espírito inspirava. E todos os que ouviam
entendiam a mensagem de Deus na sua própria língua.
Aqui há uma mensagem importante. O Espírito Santo leva os
discípulos a ultrapassarem as diferenças para comunicar a mensagem de Deus para
unir numa mesma comunidade de amor, povos de todas as raças e culturas. O
Espírito modifica profundamente as relações humanas. Sem deixarem a sua cultura
e as suas diferenças, todos os povos escutarão a proposta de Jesus e terão a
possibilidade de integrar a comunidade da salvação, onde se fala a mesma língua
(a linguagem do amor) e onde todos poderão experimentar essa comunhão que torna
povos tão diferentes, irmãos.
O Salmo 103, o canto que agradece a Deus a criação de todos
os seres da terra, é entendido aqui como o poder divino de conservação da vida
criada por Deus. Se pensarmos na Igreja composta por pessoas que receberam o
Espírito Santo no Batismo, entendemos que a Igreja continua viva pela ação do
mesmo Espírito Santo.
Na segunda leitura, São Paulo fala dos dons do Espírito
Santo aos cristãos de Corinto. Porém, São Paulo ensina que não é só o Espírito
Santo que age em nós e sim toda a Santíssima Trindade.
Ele diz que há diversidades de dons na comunidade, mas o
Espírito é o mesmo. E o Espírito Santo é a Terceira Pessoa da Santíssima
Trindade. Há diversidade de trabalhos pela comunidade, mas o Senhor é o mesmo.
E o Senhor é a Segunda Pessoa da Santíssima Trindade. Há diversidade de
atividades na Igreja, mas para todos há um só Deus. E o Deus único é Deus Pai,
a Primeira Pessoa da Santíssima Trindade. São Paulo nos está dizendo que a
Santíssima Trindade toda está agindo na Igreja. Em outras palavras: sem a
Santíssima Trindade a Igreja não existiria! Mas, em particular, é do Espírito
Santo que a Igreja recebe diferentes dons.
Todos esses dons individuais servem ao bem comum de toda a comunidade.
Por fim, São Paulo lembra como essa união dos cristãos em sua diversidade de
raças, línguas, condição social etc. É efeito do Espírito Santo. Disso, nasce
uma unidade espiritual que São Paulo chama de Corpo, o de Cristo, que é a
Igreja, do qual Cristo é a Cabeça. Mas Os “dons” que recebemos não podem gerar
conflitos e divisões, mas devem servir para o bem comum e para reforçar a
vivência comunitária. São Paulo Sublinha que o dom por excelência é a confissão
de Jesus como Senhor, por isso ninguém pode usar do seu dom para se colocar
acima dos outros já que Deus age em todos os que seguem Jesus.
Em Jo 20,19-23, há o relato da entrega do Espírito Santo aos
apóstolos de outro modo. Agora é Jesus pessoalmente quem dá o Espírito Santo
aos discípulos reunidos no Cenáculo. E não foi em Pentecostes, foi no próprio
dia de Sua Ressurreição. Como entender essa discordância entre esse Evangelho
de João e o relato de Pentecostes em At 2,1-11? A resposta está na distinção
das duas teologias: a de São Lucas, nos Atos, concentra-se no dia de
Pentecostes para acentuar interiorização da Lei de Moisés pelo dom do Espírito
Santo à Igreja; a de São João, em seu Evangelho, acentua a Vida Nova que está
em Jesus Ressuscitado e que é o Poder do Espírito Santo. Jesus não conserva só
para Si essa Vida Nova, mas passa-a para os discípulos.
O dom do Espírito Santo por Jesus tem algo mais: os
apóstolos recebem junto o poder de perdoar ou não os pecados. Isto porque que
os apóstolos vão batizar os convertidos do pecado para a Vida Nova, dada pela
água do Batismo, no qual o Espírito Santo age vivificando quem estava morto
pelo pecado. Em relação a nós, batizados em nome de toda a Santíssima Trindade,
sabemos que o Espírito Santo nos foi dado no Batismo, sacramento em que fomos
perdoados de todo pecado, em que renascemos para a Vida Nova do Cristo
Ressuscitado, em que nos tornamos filhos de Deus e, ao mesmo tempo, nos
tornamos membros do Corpo de Cristo, sua Igreja. Tudo isso é o que nos relembra
a festa de Pentecostes e nos questiona: A Igreja de que fazemos parte é uma
comunidade de irmãos que se amam, apesar das diferenças? Está reunida por causa
de Jesus e à volta de Jesus? Está atenta, deixando-se guiar pelo Espírito Santo
que a sustenta?
A Igreja de que fazemos parte deve ser espaço de liberdade e
de fraternidade. Nela todos encontram lugar e são acolhidos com amor e com
respeito – mesmo os de outras raças, mesmo aqueles de quem não gostamos, mesmo
aqueles que não fazem parte do nosso círculo, mesmo aqueles que a sociedade exclui.
Adriano Bonfim
Em estágio Pastoral